quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Israel : o mosaico desajustado

Aterrei em Tel Aviv, em Israel, "a única democracia do Médio Oriente", no início de Novembro. No controlo de passaportes, a funcionária começou um interrogatório que foi interrompido por gritos e ameaças quando ouviu a palavra "Palestina". 

Aconselharam-me a não mentir e foi o que fiz. Depois de gritarem comigo mandaram-me para uma sala onde aguardei que outro funcionário chegasse para continuar o interrogatório interrompido na fila de controlo dos passaportes. Outros viajantes sentavam-se a esperar, e um segurança estava à porta a certificar-se que nenhum de nós saía da sala. 


"Onde vais?" "O que vais fazer?" "Porquê?", continuou o interrogatório. Evitei voltar a falar da Palestina, mencionei o voluntariado com crianças em Hebron, a vontade de viajar pelo território e de trabalhar num kibbutz (este último bastante improvável). Acho que foram os kibbutz que me salvaram, e fizeram com que me dessem o visto pouco depois.

Mas passei demasiado tempo a imaginar que me deportavam, e que não iria poder entrar no território. Que só ia ver a cúpula dourada da mesquita de Jerusalém em fotografias, e imaginar como seria flutuar no mar Morto: condição a que muitos palestinianos estão condenados. A impossibilidade de pisar a terra tão sonhada, de onde as raízes foram cortadas antes de sequer nascer. 


Desenraizamento: laranjeira suspensa do artista Ran Morin (Yaffa)
Foi essa condição que primeiro me ligou a esta terra. Há três anos atrás conheci Obai em Lisboa. Obai é palestiniano, mas não tem o direito de entrar em Israel ou nos territórios palestinianos. Tal como outros milhões de palestinianos deslocados, que compõem uma das maiores populações apátrida do mundo, a sua nacionalidade é fragmentada. Foi o seu desenraizamento que me ligou a esta terra, fascinante com toda a sua história e beleza, com todas as suas contradições, injustiças e complexidades. 

Em Tel Aviv fui supreendida pela diversidade cultural de Israel. Fui com a ideia pré-fabricada do israelita descendente de judeus europeus, branco e ocidental. O que vi ao chegar foi um cenário completamente diferente. A população de Israel é multicultural e imensamente diversa. A elite israelita é liderada por judeus brancos, mas para além dos judeus descendentes de europeus, há judeus asiáticos e judeus africanos que compõe uma percentagem muito significativa da população, para não falar da população não-judaica, os 20% de árabes/palestinianos que compõe a demografia israelita.


Israel é um mosaico que não encaixa
O primeiro israelita que conheci foi Jacky, nascido em Marrocos.  Empresário de sucesso, Jacky fala hebraico, árabe e inglês, mas a sua língua materna é o francês. Israel é um dos países com a maior diversidade linguística. Para além do hebraico e do árabe que constituem as línguas oficiais, inglês, russo, francês e amárico são línguas amplamente faladas. 

Por isso vi em Israel um mosaico desajustado: um estado judeu embutido num território onde vive uma população não-judaica, e onde ser judeu adquire mil tons e significados. Basta olhar para o mapa e ver no picotado das fronteiras as peças que não encaixam.

Yaffa - a cidade antiga árabe

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