Cheguei a Túnis no dia em que celebravam seis anos do que ficou conhecido como a “Revolução de Jasmim”, que marcou o começo da Primavera Árabe. Chovia e estava frio, o jasmim não sobreviveu a este inverno, e poucos tunisinos saíram à rua para celebrar a data da revolução. Por causa do frio, indiferença, ou por sentirem que seis anos depois há poucas razões para celebrar.
Portão da cidade antiga de Túnis |
No dia 14 de Janeiro de 2011, depois de quase um mês de protestos que começaram com a autoimolação de um vendedor ambulante, o governo foi dissolvido e o presidente Ben Ali, no poder há mais de duas décadas, deixou a Tunísia. A imolação de Mohammad Bouazi, que com 26 anos vendia fruta nas ruas da cidade de Sidi Bouzid para sustentar a família, foi um acto de protesto contra a humilhação, os abusos de poder de oficiais locais e a falta de condições de trabalho que incendiou a Tunísia, e cujas chamas de espalharam por todo o Médio Oriente.
Já passaram seis anos, mas ao caminhar no centro de Túnis pela avenida Bourguiba, onde milhares de manifestantes se reuniram durante os protestos, vejo arame farpado, veículos militares e soldados armados a proteger edifícios governamentais, como se a revolução ainda estivesse inacabada, e a Tunísia estivesse ainda a decidir o que fazer com os slogans de liberdade, dignidade e trabalho.
Arame farpado, veículos militares e soldados na avenida principal de Túnis |
Dias depois, assisti a uma manifestação no centro de Túnis. Dezenas de activistas seguravam cartazes com nomes de cidades no sul da Tunísia, onde o aniversário da revolução foi marcado por protestos contra a pobreza e a marginalização social. No ano passado houve tantos protestos e instabilidade nas cidades marginalizadas do centro e sul do país que o governo impôs um recolher obrigatório durante a noite.
“Não estamos a conseguir cumprir [as expectativas da revolução] porque o desemprego e as desigualdades sociais aumentaram”, disse o primeiro-ministro Youssef Chahed na televisão nacional durante o sexto aniversário da revolução.
Demonstração de solidariedade com protestos no sul |
Aziz, um engenheiro informático de Túnis, fala-me da enorme desigualdade entre o litoral norte e o sul, e dos protestos que têm decorrido nas zonas mais marginalizadas. Fala não só da desigualdade entre norte e sul, mas também da divisão entre islamistas e laicos que tem sido central na política tunisina. Para Aziz, a revolução mudou pouco. “O ditador pode ter caído, mas a corrupção e os abusos de poder continuam”, diz-me com pessimismo. “Precisamos de tempo, acho que só daqui a uma década é que a Tunísia pode encontrar equilíbrio e democracia”.
A revolução teve um impacto negativo na economia |
Após a queda do governo autoritário de Ben Ali, no poder há 23 anos, a Tunísia teve as primeiras eleições livres, e ao contrário dos países na vizinhança que caíram em guerras civis ou golpes militares, a revolução tunisina foi vista como um modelo de transição democrática. Apesar da instabilidade que se seguiu à eleição de um partido conservador islamista e uma forte mobilização da oposição, ou dos assassinatos políticos atribuídos a grupos de salafistas extremistas, o esforço pelo diálogo nacional e compromisso foi reconhecido internacionalmente com o prémio Nobel da Paz em 2015, atribuído ao sindicato de trabalhadores, advogados e activistas de direitos humanos na Tunísia.
Se há uma coisa com que todos os tunisinos que conheci concordam, é o orgulho no prémio, e admiração pelos que enfrentaram o exército para exigir mudança de regime e democracia. "Foi aqui que a Primavera Árabe começou, e só aqui é que teve sucesso", diz-me Sofiene um jovem fotógrafo de Túnis. Mesmo com o cenário de crise económica, a maioria continua a ter orgulho no que foi conquistado com a revolução.
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